quinta-feira, novembro 30, 2006

Fernando Pessoa

(Lisboa, 13 de Junho de 1888 — Lisboa, 30 de Novembro de 1935)

II.
O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de, vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...
Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender ...

O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar ...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...

In Fernando Pessoa, O Guardador de Rebanhos / Alberto Caeiro, [post. Maio 1914]; [Lisboa]

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13 comentários:

Anónimo disse...

O Caeiro a seguir ao Kertész surpreendeu-me inicialmente, mas depois encontrei um fio de ligação.
Diz o poema do Paul Dermée sobre o fotógrafo:
«Eyes of a child whose every look is the first...»
E o poema do Alberto Caeiro:
«O meu olhar é nítido como um girassol /
Sei ter o pasmo essencial/que tem uma criança ...»
Ou é delírio meu ?

isabel disse...

Sabes qto tempo demorei a atravessar a av. da Liberdade, sabes, sabes? 45 minutinhos, os marotos...

Adorei o programa :) Bjocas

Luísa R. disse...

Desculpem ainda não ter respondido :O(
Isto por aqui tem andado muito atarefado.
Heitor, não é delírio teu :O)
Daqui a 2 dias já venho para aqui. Até lá, bjs.

soledade disse...

Bom mesmo foi o link ao manuscrito do Guardador. Obrigada.
P.S.: A esta hora já foi a vernissage.

Anónimo disse...

Ola
=)
Belissimas a foto, e o poema magnifico ( a pesar de nao gostar muito de Fernando pessoa )
Parabens!

margarida disse...

«Amar é a eterna inocência» e com este verso faria uma tese... Bonito poema, bonita fotografia e lindo o blog.

Luísa R. disse...

Heitor,

Desculpa não ter respondido antes mas tenho andado com muito trabalho.
Mas venho sempre aqui ao fim do dia ler os comentários.

Quanto ao post do A. Caeiro, 30 de Novembro foi o dia da morte de Fernando Pessoa. Daí a homenagem.

A escolha do poema teve a ver com o olhar.
O olhar inocente de quem vê as coisas como se fosse pela primeira vez, o que considero essencial a qualquer tipo de criação.

E não é delírio teu.
Também teve a ver com o poema do Paul Dermée, que eu não conhecia.
E que me ficou aqui dentro.

Mais uma vez, agradeço-te pelo que me dás a conhecer :)

Luísa R. disse...

Isa,

Já sei :(
Teve a ver com o colosso fabuloso e nunca visto, conhecido por «a árvore de Natal maior do mundo».

Quase que tira do podium a maior feijoada em cima de uma ponte alguma vez feita desde que o mundo é mundo.

É um orgulho!

E suplanta largamente o facto de Portugal estar nos últimos lugares da Europa em quase tudo.
Em quase tudo, claro. Não nos podemos esquecer que também estamos à frente no que respeita a acidentes rodoviários.
Afinal, temos de manter certos padrões.

bjs

Luísa R. disse...

Soledade,

Acabei por não ir.
O meu pai estava doente e não me sentia bem ir assim.
Por outro lado, sempre que há uma inauguração, a minha timidez ultrapassa os limites do razoável...

bjs

Luísa R. disse...

Olá Ane,

Não gostas de Fernando Pessoa?
Arrisco-me a dizer que será por o não conheceres bem :)
Do bocadinho que conheço dele, considero-o um dos maiores escritores do século XX...

bjs

Luísa R. disse...

Parole,

«Amar é a eterna inocência».
Concordo contigo. Uma tese.
Ou toda uma vida.

Quanto ao blog, já sabes que o elogio é recíproco :O)

bjs

pedro disse...

"eu não tenho filosofia: tenho sentidos" a capacidade que este senhor tem de me resumir as ideias em palavras ... vi noutro dia um livro fantástico do brassai na barata e lembrei-me logo de ti. bjs

Luísa R. disse...

É. O Alberto Caeiro era assim :O)

Quanto ao Brassaï, grande senhor!

Bjs